segunda-feira, 2 de maio de 2011

Sábado, 3am

(clean version)

Era sábado de madrugada. Ela sentia alguma coisa estranha. Sabia que algo se passava mas não queria pensar muito, não queria descobrir o que era.
Levantou, foi até a cozinha beber água. Não tinha sede, mas beber água era uma desculpa pra sair da cama e decidir o que fazer a seguir. A idéia era ocupar os neurônios com algo fútil, não pensar.
Foi até a varanda. Estava frio, mas isso não a impediu de acender um cigarro. O frio, que era tanto, não foi capaz de congelar os pensamentos. Era apenas frio, o que a obrigou a terminar aquele cigarro o mais rápido possível.
Voltou ao clima agradável da casa, sentou em frente ao computador e quis escrever. Ainda estava gelada. Sete minutos na varanda tinham sido suficientes para lhe gelar a pele, a carne, os nervos, o sangue, os ossos, mas não a droga do pensamento. Ainda sentia muito frio. Era culpa da falta de roupa, pensou, afinal estava apenas de meias, calcinha e blusa. Queria que tudo fosse quente, tudo a não ser os pensamentos que a mantinham acordada. Esses sim poderiam congelar, mas esses, nela, nunca congelavam. Estavam, quase sempre, em ebulição.
Olhou para a tela do computador. O que iria fazer? Iria fazer alguma coisa? Talvez voltar pra cama. Queria escrever, precisava escrever, deixar sair palavras, palavras atrás de palavras, mesmo que sem nexo algum.
Estava com frio, ainda com muito frio, mas resolveu tirar as meias. Colocou os pés descalços no chão gelado. Queria que o frio dos azulejos fosse tanto a ponto de se convencer que era melhor voltar ao edredon quentinho e dormir. O imenso frio da varanda não foi suficiente, e, como era de se esperar, o frio do chão também não. Tirou a camiseta.
Precisava escrever mas não sabia o quê. Tinha tantas, tantas coisas para escrever, mas não conseguia escrever nada. E não era por causa da falta de sono, não era pelo frio que sentia, não era pelo chão gelado nos pés, não era pelo corpo despido.
Desligou o computador e resolveu voltar para o quarto.
Sábado de madrugada. Gente nos bares, nas boates, nas ruas. Risos, álcool, danças, sexo. E ela ali, sentindo o cheiro do próprio travesseiro, desejando que aquele cheiro fosse outro. Um cheiro que ela não sabia descrever e nem sequer sabia se existia.
Era ridículo. Mas ela não se sentia ridícula. Não conseguira escrever nada, mas se sentiu bem somente pelo fato de estar aquecida. Os pensamentos em ebulição, evaporando...
Não sorriu, não chorou, apenas se abraçou mais um pouco, apertou o travesseiro cheiroso, agora sem frio.

2 comentários:

Anônimo disse...

Não posso saber se essa é você, se não é. Se alguém que você conhece, ou se são você e mais alguém misturadas. Essa sensação de estar preso, de poder e não querer, ou querer e não poder, que às vezes são a mesma coisa. De qualquer forma, verdadeiro o sentimento e por isso mesmo importante escrevê-lo, lê-lo.
Léo

.h disse...

Despir as meias é mais fácil que os pensamentos sem nome. =P